Ontem, vi um corpo. Ele estava na rua, braço jogado para o lado, como nesses filmes policiais que a gente vê. Mas esse era de verdade, não era ator, nem sangue de mentira. Um lençol, já ensanguentado, cobria seu rosto e parte do que dava. Luzes vermelhas iluminavam os rostos curiosos que se aglomeravam para ver o acidente. Vi as sirenes ao longe e, imaginando ser uma blitz, me assegurei que todos estivessem de cinto. Mas ao chegar perto, percebi que havia algo errado, não era simplesmente uma blitz. Olhei não mais que cinco segundos e lá estava o corpo estirado no chão. Aquilo me invadiu por dentro.
Não pude pensar em mais nada durante o resto do caminho para a casa. Martelava em minha mente a efemeridade da vida e como em um segundo aquele rapaz podia ter deixado de ser filho, pai, namorado, marido, empregado ou patrão para se tornar simplesmente um corpo sem vida. Aquilo era extremamente perturbador.
Antes de dormir, enquanto fazia minha leitura da Bíblia, saltou-me os olhos coincidentemente (para quem acredita em coincidências): “Que é a vossa vida? Sois, apenas, como neblina que aparece por instante e logo se dissipa” (Tg 4:14). Aquilo foi tão forte, que era impossível ignorar. Afinal, não é isso mesmo? Buscamos com tanta intensidade conquistas terrenas, queremos sempre mais dinheiro, status, um corpo invejável, o melhor currículo e deixamos de lado o que realmente importa, o que é eterno. A vida espiritual, uma relação sincera (e não obrigatória-dominical) com Deus tem de ser prioridade. Estamos cuidando tanto do corpo e da mente, e deixando a saúde de nossa alma de lado. Apesar de polêmico, esse é um assunto que merece reflexão. Não podemos simplesmente ignorá-lo, da mesma forma que não é possível ignorar um corpo, sem vida, estirado no chão.
domingo, 24 de outubro de 2010
O Corpo
quarta-feira, 13 de outubro de 2010
O solitário da noite
Ele se sente um boêmio nato. Aproveita qualquer brecha e sai pela madrugada a vagabundiar pelas ruas escuras da cidade. Mexe com as fêmeas distraídas e faz tentativas frustradas de uma noite de amor. Elas o desprezam. Seus olhos cor de mel, com certo ar carente, não comovem mais as garotas como antes. Para essa nova geração, amor é uma questão de cheiro e ele, de longe, aponta para um aroma indescritível: o de um perdedor.
Ele não tem nada a oferecer. Nem virilidade, nem bens materiais, nem compromisso. Ele é um solitário da noite, sem amigos, sem destino. Nunca se sabe para onde vai, ele simplesmente some na neblina da noite em busca de liberdade. A noite é seu momento de fuga. Na rua comprida e completamente vazia não há portões, não há o chamado de ninguém, é onde reina. Sente-se tão poderoso e imponente quanto um lobo uivando para sua lua cheia.
Ele vaga pelas sombras sem incomodar ninguém, anda por horas e quando se cansa, volta. Ele entra então em casa, pé ante pé, e vai atrás de sua cama quente e da comida no prato. Dorme até tarde, busca chamego, e à noite Tobi vira Rex e encara o personagem “vira-latas mau caráter” e segue rumo a sua vida de boêmio da noite.